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quarta-feira, 14 de julho de 2010

Reprodução Humana Assistida (leis)


Conceito:

Denomina-se inseminação artificial a introdução de esperma no interior do canal genital feminino, por processos mecânicos, sem que tenha havido aproximação sexual com o fim de originar um ser humano. O operador recolhe em uma seringa o material fecundante, injetando-o na cavidade uterina da mulher ou, não sendo isso possível, retira o óvulo da mulher para fecundá-lo na proveta, com sêmem do marido ou de outro homem para, depois, introduzi-lo em seu útero ou no de outra. Essa técnica pretende auxiliar a resolução dos problemas da fertilidade humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenham sido ineficazes. A primeira menção histórica relata a prática por John Hunter, nascido em 1728 e falecido em 1793, sendo imprecisa a data de seu experimento.

Espécies:

Inseminação artificial humana homóloga ou conjugal e Inseminação artificial heteróloga ou extraconjugal.

Em relação a isso, o Código Penal Brasileiro de 1969, em seu artigo 267, muito embora nunca tenha entrado em vigor, dispunha que a mulher que utilizasse sêmem de outro homem, desde que sem o consentimento de seu consorte, incorreria em pena de detenção até dois anos. Só se procederia à ação penal mediante queixa.

Nosso sistema penal é silente em relação a esta prática conceptiva. O Código de Ética médica, entretanto, em seu artigo 53, proíbe a heteroinseminação sob pena de imposição das sanções previstas nas alíneas do artigo 22 da Lei n.º 3.268 ou do artigo 17 de sua regulamentação, o Decreto n.º 44.045, e que são:

- advertência confidencial em aviso reservado;

- censura confidencial em aviso reservado;

- censura pública em publicação oficial;

- suspensão do exercício profissional "ad referendum" do Conselho Federal.

No Brasil, o Projeto de Lei 90/99, veda o direito à reprodução assistida às mulheres solteiras, e a casais homossexuais, admitindo-o apenas a casados e conviventes.

Reflexos Jurídicos:

O tema suscita reflexões, do ponto de vista jurídico-penal quanto a:

- obtenção do sêmem;

- obtenção do óvulo;

- implantação do ovo;

- utilização do material fertilizante;

Obtenção do sêmem:

A coleta do material e sua utilização dependerão de anuência expressa dos interessados, ligados pelo matrimônio ou união estável, uma vez que têm propriedade das partes destacadas de seu corpo, como sêmem e óvulo.

Deverão estar vivos por ocasião da inseminação, manifestando sua vontade, após prévio esclarecimento do processo a que se submeterão.

Não há regulamentação específica quanto à inseminação post mortem.

Entretanto, a ausência do consentimento do marido poderá ser motivo justificador da separação judicial por adultério casto, ou da seringa, por afetar a solidez do casamento, configurando-se a injúria grave, pois que a paternidade forçada atinge a integridade moral e a honra do marido, fazendo-o assumir uma obrigação indesejável.

Nos países em que há regulamentação para as questões de inseminação, a anuência, o consenso escrito do marido, é imprescindível, necessitando, em alguns casos, de autorização judicial.

O arrependimento do marido, após a realização da fecundação artificial, tentando provocar o aborto, gerando infanticídio, abandono ou maus-tratos, podem basear-se na alegação de induzimento a erro, ou anuência por coação.

Obtenção do óvulo:

Da mesma forma que o sêmem, o óvulo é parte destacada do corpo da mulher, que lhe detém propriedade.

Sua utilização depende, pois, de concordância expressa da detentora.

O uso da violência contra a mulher, induzindo-a à prática do processo de inseminação por maliciosa provocação, ou por dolo de aproveitamento (possível desde que o marido ou companheiro a faça crer que se trata de inseminação artificial homóloga, quando, na verdade, é obtida com a utilização de esperma de terceiro), podem dar origem à alegação de estupro científico, como fundamento para o pleito de submissão ao aborto legal.

Ter-se-á, também, injúria grave, se considerada a maternidade forçada pela inseminação artificial, homóloga ou heteróloga, não desejada pela mulher.

Implantação do óvulo:

Ficou abalada a máxima "mater semper certa est", com o avanço da biotecnologia e da engenharia genética.

Isto porque, a determinação da maternidade caberá ao judiciário, se o óvulo implantado não for o da esposa receptora, mas de uma doadora, ou ainda, se a esposa em cujo útero foi implantado o óvulo de outra, fecundado pelo sêmem de um terceiro.

Tanto o doador do sêmem quanto a doadora do óvulo, ou a cedente do ventre, podem pretender judicialmente o reconhecimento da paternidade, aí entendida em seu sentido mais amplo.

Em relação ao Direito alienígena, essa matéria também não é de entendimento uníssono.

O anonimato do doador e do receptor do material genético e daquela que cedeu o ventre, sob pena de responsabilidade civil e criminal, pode causar graves problemas como o da possibilidade de incesto, a violação ao direito de identidade e o risco de degeneração da prole do concepto.

Com as técnicas modernas, há possibilidade de 100% de acerto na determinação do sexo do bebê. O Conselho Federal de Medicina considerou antiética essa seleção de sexo, sem que haja uma margem mínima de erro, por ser indicativa do desprezo a outras vidas geradas. Trata-se de seleção eugenésica.

A embriologia pode selecionar certos caracteres genéticos para alcançar uma depurada forma de eugenia, que substitui o direito de procriar pelo direito de nascer, revivendo a prática do Nacional-Socialismo de Hitler, que propugnava a pureza da raça ariana.

Contudo, não há diagnóstico genético que garanta a transmissibilidade de caracteres comportamentais, intelectuais ou físicos.

Outro risco é o da identificação de defeitos genéticos em embriões, selecionando os melhores, fazendo surgir uma perigosa espécie de eugenia, que poderá levar a um "liberalismo biológico", fazendo com que as pessoas economicamente privilegiadas possam ter uma prole menor.

A Lei Espanhola, n.º 35/88, em seu artigo 20, pune severamente a submissão da mulher a uma lavagem uterina, nos casos de fecundação natural, para a retirada de embriões indesejados, preservando os bons e reimplantando-os.

A locação do útero ou de ventres mercenários implica aos olhos da Lei nacional em um pacto imoral e contrário aos bons costumes, porém, não proibido pela legislação. O Conselho Federal de Medicina, na Resolução n.º 1.358/92, aceita, evitando inúmeros problemas, o empréstimo ou doação temporária de útero, apenas no âmbito familiar, num parentesco colateral de até segundo grau, vedando, portanto, qualquer tipo de pagamento.

Utilização do material fertilizante:

Nem todo material resultante da fertilização "in vitro" é utilizado, quer porque produzido em número maior do que a possibilidade de implantação, quer por motivos outros, decorrentes inclusive de força maior.

Antes da fecundação "in vitro" a mulher é submetida a tratamento hormonal para ter uma superovulação, para que vários óvulos sejam fertilizados na proveta, implantando-se, porém, por recomendação médica, apenas quatro deles no útero.

Para aqueles que entendem que não se trata de produto gravídico, já que o início da vida e da personalidade jurídica relaciona-se com a nidação - logo, embrião não implantado não é pessoa - não há possibilidade de sujeitá-lo a aborto. Para outros, trata-se de embrionicídio eugênico, uma vez que a lei assegura seus direitos como potencialidade de uma vida humana, cuja conversão em pessoa dá-se quando o sistema nervoso é ativado e os órgãos começam a funcionar, o que ocorre pelo menos 14 dias após a concepção, mesmo quando não implantado no útero ou crioconservado, devendo haver tutela jurídica desde a fecundação do óvulo, em todas as suas fases.

Para o Projeto de Lei 90/99, que visa regulamentar as técnicas de reprodução humana assistida, o congelamento de embriões será punido, com pena privativa de liberdade de 6 a 20 anos, pois os médicos poderão retirar apenas 3 ou 4 óvulos da mulher. Com isso haverá redução de embriões a serem implantados no útero, eliminando-se o problema dos excedentes, porém, aumentando-se a possibilidade de o tratamento fracassar.

Sempre há a possibilidade de ocorrer óbito do casal encomendante em um desastre após a fecundação, mas antes da implantação do embrião, gerando dúvidas acerca da implantação em útero alheio, carecendo da intervenção do judiciário, inclusive para decidir sobre a destinação do embrião.

O uso indiscriminado de material fertilizante congelado torna prudente limitar o número de vezes em que será empregado para minimizar o risco de consangüinidade. O ideal seria vedar sua utilização por mais de uma vez. Pelo Projeto de Lei n.º 90/99, apenas gametas congelados podem ser usados e só por um casal, até duas gestações.

Outra questão que merece destaque é a que diz respeito à propriedade do material fertilizante congelado: pertenceria ele à mãe encomendante, à doadora, ao doador do sêmem ou à clínica? A questão deverá ser respondida no âmbito civil, mas poderá gerar conflitos penais se o embrião for objeto de furto, roubo ou dano ou, ainda, quanto à responsabilização penal em caso de eventual degeneração, por ocasião da manipulação genética. Para o grupo daqueles que entendem que a vida se inicia com a fecundação, o material fertilizante poderá ser sujeito passivo de homicídio, seqüestro ou maus-tratos?

Sugestões de lege ferenda, para um Ante-Projeto sobre reprodução humana:

Segundo Maria Helena Diniz, a reprodução humana assistida deveria ser admitida apenas por motivo terapêutico, na forma homóloga inter-vivos, em mulher casada ou que viva em união estável, desde que se use o material fertilizante do marido ou companheiro, uma só vez, e, se não houver risco, para sua saúde e à do filho, facilitando-se a adoção, inclusive a pré-natal.

A Resolução do Conselho Federal de Medicina n.º 1.358/92, inciso I, n.º 2, assegura o direito de alguém à concepção e à descendência, por meio de fertilização assistida, se não colocar em risco a vida ou a saúde da paciente e do possível descendente.

Atendendo aos reclamos da Bioética, bem como aos de seus princípios basilares, impõe-se o estabelecimento de normas que garantam o respeito devido aos valores básicos da natureza, do homem e da vida social, protegendo não só a vida, mas também a integridade física e mental.

A revolução Biotecnológica fatalmente levará à criação de novos crimes ligados aos abusos que poderão advir do avanço e do impacto das ciências biomédicas. Daí porque a necessidade de adequação do Estatuto Penal vigente a estes novos crimes, bem como a elaboração de um Estatuto Jurídico Penal, reforçando as modalidades delituosas previstas na Lei n.º 8.974/95, tais como:

- Crimes de manipulação genética, punindo atos realizados por procedimentos experimentais, com fins não terapêuticos, que venham reproduzir, selecionar ou alterar a constituição do genoma não patológico de seres vivos (são exemplos desses delitos, a alteração genética que viola a inalterabilidade e a intangibilidade do patrimônio genético não patológico do ser humano, modificando-lhe a estrutura genética, por meio de intervenções sobre gametas, embriões, fetos e pessoas já nascidas; seleção genética, que se dá por meio de manipulações, que, com fins não terapêuticos predeterminam caracteres genéticos do ser humano em formação, mediante seleção de gametas, ou outro meio artificial que afronte a identidade genética e a irrepetibilidade do ser humano; clonação genética, que atenta contra o direito de identidade genética, irrepetibilidade e variação, produzindo um ser humano biologicamente idêntico ao outro; hibridação, decorrente de manipulação que visa o intercâmbio genético humano para formação de híbridos, resultante de mistura de gametas de diferentes pessoas, ou o desenvolvimento da fecundação interespécie entre um gameta humano e um de outra espécie; biotecnológicos de seres não-humanos, oriundos da utilização da engenharia genética sobre genes de animais, plantas, vírus e bactérias, para a produção de armas biológicas);

- Crimes de manipulação ginecológica ou obstétrica, relacionados com a reprodução humana, por meios não naturais, com fins não terapêuticos, e não dirigida à modificação do genoma (são exemplos desses delitos: reprodução assistida post mortem, obtida a partir da técnica de congelamento de sêmem, óvulo e embriões; partenogênise, estimulação artificial de um óvulo para provocar a duplicação de sua série haplóide, sem necessidade da penetração pelo espermatozóide, atingindo a dotação genética dupla diferenciada - masculino/feminino - retirando-a da reprodução; ectogênise, que visa obter o desenvolvimento de um ser humano fora do útero, mediante a construção do útero artificial ou a utilização de um útero animal ou, ainda, lançando mão da gravidez masculina; transferência, do embrião manipulado geneticamente ao útero de uma mulher, sem fins terapêuticos, para obtenção de seres híbridos ou de qualquer outro produto que dali possa resultar; produção, utilização e destruição de embriões humanos, com a finalidade de experimentação, destinados à procriação, sem fins terapêuticos, podendo valer-se inclusive de seus órgãos, tecidos e células.

Dra. Maria Rosália Pinfildi Gomes,

Mestranda em Direito Penal e

Professora do Complexo Jurídico EPJ .


FONTE: http//:direitodefamilia.com.br

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